Thursday, April 16, 2009

Belenenses - Declínio de um histórico *

Se falarmos com um estrangeiro sobre o futebol lisboeta, e se o nosso interlocutor for minimamente informado acerca do desporto-rei, seguramente que os nomes de Benfica e Sporting serão pronunciados, e pouco mais. No entanto, lá para os lados de Belém – onde, por acaso, o futebol até recebeu o seu primeiro forte impulso organizativo – habita um clube que também já fez parte da elite alfacinha. Um clube que chegou a ser campeão nacional, que foi orientado por grandes treinadores, como Fernando Riera, Helenio Herrera ou Otto Glória, que teve jogadores lendários, como Matateu, Vicente e Pepe, mas que, apesar do peso histórico, tem vindo a reduzir o seu estatuto no futebol português.

O enfraquecimento gradual do Clube Futebol Os Belenenses deve-se, em boa parte, à complacência e má politica dos sucessivos dirigentes que têm passado pelo emblema do Restelo. O clube parece carregar uma cruz, que ironicamente faz parte do seu emblema.

Esta época é um exemplo claro destas dificuldades, com a equipa a agonizar no fundo da tabela classificativa. E o mais paradoxal é o facto de ter vindo de duas temporadas extraordinárias, onde, inclusive, regressou às competições europeias e marcou presença numa final da Taça de Portugal. O problema é que este ano, para além do abandono do treinador Jorge Jesus, saíram do plantel 19 jogadores, tendo entrado 17 novos atletas, quase todos oriundos do futebol brasileiro – muitos vindos de divisões secundárias, outros das reservas de alguns clubes do Brasileirão.

Face a esta profunda transformação, o futebol da equipa afigurou-se pouco consistente e provocou os maus resultados sofridos nas primeiras jornadas. O treinador brasileiro Casemiro Mior acabou por ser dispensado, sem grande surpresa, tendo entrado para o seu lugar, o já experimentado nestas lides, Jaime Pacheco. O treinador nortenho de imediato começou a trabalhar na construção de uma equipa à sua imagem, recorrendo ao mercado de Inverno para realizar os necessários ajustes nesse sentido. O problema é que enquanto este complicado empreendimento foi ganhando forma, o campeonato não parou, e com isso o clube azul foi perdendo terreno até acabar por se fixar nas sufocantes posições do fundo da tabela. Nesta altura, o espectro da quarta descida de divisão da sua história é uma constante no dia-a-dia do clube.

Princípio da ruína

A queda do Belenenses tem início ainda na década de 80, com a primeira descida de divisão na história do clube. O desastre ocorreu na temporada 81/82 durante a qual, a equipa conheceu sete treinadores, entre os quais Artur Jorge e Nelo Vingada. O inferno da segunda divisão durou duas épocas.

O abandonado campo das Salésias, antiga casa do Belenenses, assemelha-se à perda de importância que o clube tem vindo a sofrer no futebol nacional.


A seguir a esta tempestade, porém, veio uma agradável bonança. O clube reergueu-se e atingiu boas classificações, como um brilhante 3.º lugar em 87/88. Foram também atingidas duas finais do Jamor, sendo que numa das vezes, na época 88/89, o troféu foi mesmo conquistado pelos azuis – o último grande troféu oficial conquistado (vitória frente ao Benfica por 2-1). Também nesse período, as noites europeias voltaram a animar o Estádio do Restelo, com particular destaque para uma eliminatória com o Barcelona que terá promovido, talvez, a última grande enchente. Neste Belenenses, orientado por Marinho Peres, sobressaíam jogadores como Mladenov, Sobrinho, José António, Chiquinho Conde, entre outros. Findo este período, porém, o clube voltaria a cair nas profundezas da Liga de Honra em mais duas ocasiões (90/91 e 97/98). O regresso às competições europeias e a uma final da Taça de Portugal aconteceu apenas recentemente, com Jorge Jesus. Pelo meio houve uma época (95/96) em que, pela mão de João Alves – com jogadores como Ivkovic, Fernando Mendes, Tulipa, Giovanella, Mauro Airez, entre outros – os azuis mantiveram, com o V. Guimarães, uma luta árdua por um lugar de acesso à Europa. Levaram a melhor os homens do Minho, contudo essa equipa garantiu um lugar no cantinho das boas memórias dos adeptos belenenses.

Na actualidade os adeptos do clube continuam a reclamar o estatuto de quarto grande do futebol português, mas apenas a história consegue legitimar tal posto, já que no campo esse estatuto tem sido disputado de forma mais justificada por V. Guimarães, Braga e Boavista (antes da recente queda ao segundo escalão).

O declínio competitivo do futebol do Belenenses, associado ao amadorismo e aventureirismo de muitas das suas direcções, e também às questões relacionadas com o envelhecimento demográfico da população lisboeta, tem levado ao contínuo afastamento dos adeptos do clube – algo que é bem visível de 15 em 15 dias nas despidas bancadas do Estádio do Restelo. O clube de Belém corre o risco de se transformar num resíduo simbólico e histórico, tal como o seu primeiro campo de futebol – as abandonadas e degradadas Salésias.

* Texto publicado em

8 comments:

Dennis Bergkamp said...

Boas! Bem visto!

Faz realmente muita confusão ver o clube como está, principalmente tendo em conta aquilo que se passa nos escalões mais jovens do clube.

Como é que um clube bem organizado, com técnicos competentes e bem formados, ao nível do melhor que há em Portugal, com os resultados que se vêm nos vários escalões... Tem uma postura tão diferente para a sua principal equipa de competição?

O que se passou na transição da epoca passada para esta, foi uma anedota, e a contratação do Jaime Pacheco, para solucionar o problema... mais uma piada de mau gosto foi.

O "Belém" merece muito mais do que isto.

Abraço

apenasfutebol said...
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apenasfutebol said...
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apenasfutebol said...

Antes de mais, obrigado pela visita e comentário bastante pertinente.

De facto, é algo que poderia ter incluído no texto: o contraste entre o que se faz de positivo nos escalões jovens, com inúmeros resultados à vista e o que se tem feito de negativo no escalão sénior.

A título de exemplo, e para além dos excelentes resultados nos diversos campeonatos jovens, refira-se a qualidade de muitos dos produtos da formação do clube: Elizeu, Gonçalo Brandão, Rúben Amorim, Rolando...que saíram do clube sem qualquer provento para o mesmo, algo que é bem revelador do amadorismo que, infelizmente, por ali tem reinado...

Joao Rodrigues said...

Li este artigo com atenção sobre o meu Belenenses, porque sendo de uma pessoa de fora imparcial esta feito de forma construtiva, não tem qualquer tradicional bota abaixo de muitos anti-Belenenses.

O problema em relação esta época, tem sido um problema recorrente no Belenenses ao longo dos anos, não ficamos com uma espinha dorsal de uma época para outra e temos recorrido de forma sistemática ao mercado brasileiro, com especial incidência nestes ultimas duas épocas, não sei o numero ao todo de jogadores vindos do Brasil mas arrisco-me a dizer que ao todo foram para ai uns 30 nos ultimos dois anos.

Em relação ao não aproveitamento das camadas jovens tal deve-se na minha opinião a nunca ter havido uma aposta clara da direcção e SAD nos nossos jogadores jovens, basta olhar para as condições do Estadio do Restelo, para se perceber que o Trabalho feito no Restelo, tem sido de grande nivel, pelo menos na minha opinião.

Em relação aos casos aqui enunciados como o Rolando e o Ruben Amorim são para mim enquanto sócio do Belenenses um amadorismo atroz, lembro por vezes de defender com meu pai com quanto amigo do Belenenses que a 1ª coisa ápos a resolução do Caso Mateus era renovar com os dois jovens era o passo seguinte, no entanto ficamos a chucar no dedo quando após o final da Taça quisemos renovar eles na altura já não quiseram pois saberiam que iam conseguir contratos melhores noutro clubes.

Em relação ao Eliseu cheira-me a comissões e empresários com SR. Jorge Jesus metido ao barulho porque prefiram ficar com um jogador como Fernando que era fraquissimo em vez do Eliseu.

Sobre o Gonçalo Brandão, e o unico que na altura não me importei muito que se fosse embora parece estranho eu sei, mas vou explicar porque, o Brandão lembro que na época 2004/2005 começou-se a impor de forma clara sob o comando de Carlos Carvalhal ( erro enorme o seu despedimento na época em troca do ze coveiro) na posição de defesa-esquerdo, dizem então as mas linguas do Restelo que o jovem terá dirigido a Carvalhal dizendo que queria jogar a central e não ha defesa-esquerdo, obviamente desapareceu da equipa tendo estado a rodar na época seguinte nas reservas do charlton. No seu regresso teve poucas oportunidades nos ultimos dois anos com JJ salvo erro jogou para ai 2 jogos como titular, um dos quais de muito má memória contra o Paços na Taça de Portugal em que fomos eliminados, e que actuando na posiçao defesa-centra, o brandão esteve muito mal.

Percebo para quem esteja de fora o futuro seja muito negro, no entanto com os problemas financeiros que sentimos. Pode ser que se finalmente se olhe para a prata da casa, sendo que neste momento já surgiu o Pele ( junior de 1º ano) embora esteja outra vez nos juniores neste momento. O Fredy já era um jogador que quem acompanhe o Belenenses ou os jogos de camadas jovens em Portugal que poderia vir a dar que falar e só acho a sua aposta tardia, apareceu bem nos ultimos dois jogos.

Já agora gostaria de realçar que o Belenenses tem uma boa safra de defesa-esquerdos como o Carlos Alves que esta emprestado ao Oriental, sendo que foi sempre titular na geração de Carriço e outros e depois aquando do europeu de sub-19 nem foi convocado, sendo que sido titular no torneio de qualificação, e que embora não se tenha estreado na equipa senior considero que tem condiçoes para se firmar no clube, caso seja aposta.
O argentino Diego que no seu 1º ano de senior tem sido sempre titular no covilha, numa liga de honra, é de realçar também.
E o Andre Pires que e titular nos juniores, e do poucos jogos que vi dos juniores do Belenenses me pareceu um jogador aproveitar para o ano.

No entanto penso que muito do futuro do Belenenses se joga no sabado nas eleições, só espero que o vitorioso seja o Belenenses.

LF said...

É um clube simpático, gosto de ir ao Restelo de vez em quando, mas a sua aproximação ao F.C.Porto e a Pinto da Costa, vai fazer com que não chore uma lágrima pela eventual descida de divisão.

No último Belenenses-Porto, aquela do Speaker pedir palmas para Pinto da Costa, foi de um servilismo repugnante.

"Este" Belenenses, se descer, não vai fazer falta.

Felipe Simi said...

Parabéns, Paulo.

Gostei muito de ler este post. E lamento por saber da agonia do Belenenses, porque - como você mesmo frizou - este triste presente pode acabar por sepultar, mais uma vez, um glorioso passado.

Abraços,
www.esportejornalismo.blogspot.com

Urariano Mota said...

Em http://urarianoms.blog.uol.com.br/
passe um olho no post "O camisa 12 do Sport".
Abraço.