Saturday, May 29, 2010

A contenda sem fim e sem vencedor

Não obstante o Mundial de futebol estar mesmo aí à porta, o mundo futebolístico centra-se na contratação de Mourinho por parte do Real Madrid. Isto, por si só, revela quem é, ou o que é o treinador português no actual contexto do futebol mundial. O vídeo do comovente abraço a Materazzi que circula por aí, também é bastante revelador.

Devolver o título europeu ao Inter, após 45 anos de desesperada espera, não tem paralelo com outros feitos do setubalense. É que o F.C. Internazionale não é o Chelsea ou o F.C. Porto – clubes cuja afirmação tem uma vintena de anos. O clube de Milão é um clube lendário, é o clube de Herrera, de Fachetti, de Meazza, é um dos colossos do futebol italiano. Para além disso, o percurso na competição europeia este ano, teve muito mais brilho do que aquele que foi trilhado na anterior conquista em 2003/2004. A equipa italiana, esta época, afastou da competição os dois maiores favoritos a conquistá-la: o Chelsea e sobretudo o axiomático Barcelona.

No entanto, a opinião pública caminha em dois prismas de análise. O comum adepto, sem fazer grande análise ou reflexão, exalta esta vitória de Mourinho com grande entusiasmo patriótico. Depois há aqueles que, por obrigação, ou por prazer, se dedicam a reflectir qualquer coisinha acerca da bola que rola e dos homens responsáveis por isso. E neste grupo não há unanimismos, o que há, por assim dizer, são dois subgrupos, o dos resultadistas e o dos românticos. A velha e gasta discussão do futebol, a única contenda que nunca terá uma final nem um vencedor. O maniqueísmo da superioridade moral de um modelo de jogo face a outro é apanágio dos românticos que vêem no actual Barcelona o grande e insofismável paradigma. O pragmatismo relativista que advoga a subalternização dos meios ou da forma para que o objectivo do jogo – que é a vitória – seja alcançado é apanágio dos resultadistas, que este ano tiveram na equipa de Mourinho o seu grande paradigma. Naturalmente que, a variável patriotismo não pode ser excluída da equação argumentativa dos resultadistas, já que muitos dos que agora rejubilam com a conquista interista são os mesmos que vociferaram todo o tipo de injúrias relativamente à Grécia de Reaghel no Euro 2004.

Mas voltando ao confronto das duas facções. Afinal quem tem razão? Há várias categorias de argumentos a servir os dois lados da barricada. O argumentário estético e o científico, são, porém, os mais aproveitados. Quanto à questão estética, a coisa assemelha-se a dois homens casados. A mulher de um deles é uma top model, bela e curvilínea, a mulher do outro é mais vulgar, bonita mas não deslumbrante. No entanto, os dois homens são felizes na mesma medida. E, quanto à colagem da estética para este assunto fiquemo-nos por aqui, pois, naturalmente, não é meu objectivo trazer para a discussão conceitos como a estética ou a felicidade, já que isso obrigaria a um outro texto, uma outra reflexão.

Em relação à questão científica – chamemos-lhe assim – a discussão pode ser mais profunda. Van Gaal, no final do jogo afirmou, com uma indisfarçável azia, que vencer como o Inter tinha vencido era mais fácil. Será que trabalhar uma equipa com foco acentuado na organização defensiva é mais fácil do que trabalhar mais a organização ofensiva? O actual treinador campeão nacional, dizia há uns tempos que o papel do treinador é sobretudo mais determinante no trabalho ao nível da organização defensiva, pois a outra, está muito mais dependente da capacidade técnica e criatividade dos jogadores. Também Platini em tempos afirmou mais ou menos a mesma coisa. Para ele o trabalho do treinador circunscreve-se à organização ofensiva. A outra, a ofensiva, depende muito mais das capacidades dos jogadores.

Esta discussão jamais terá fim, e também jamais terá um detentor da razão. A única coisa válida que se pode extrair desta altercação toda é que para a história fica o incontestável título do Inter, genialmente conquistado. Por outro lado, o brilhante e sedutor futebol do Barcelona também não fica minimamente beliscado ou posto em causa em função da eliminatória que perdeu para a equipa italiana.

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